Hortências, moldando a cor ao PH do ambiente

As hortênsias (ou hidranjas) são plantas lindíssimas e o seu nome hydrangea deriva do grego  hidra (água) + gea (terra). Existem mais de 70 espécies a florescer neste planeta azul há mais de 40 milhões de anos.

São plantas originárias do Japão e da China, que embelezam os jardins com as suas cores entre o azul, rosa, violeta ou branco.

Mas há uma certa magia que ronda a cor destas flores – é que se podem adquirir hortênsias azuis que, passado algum tempo, passam a cor de rosa. Mistério? Nem por isso.

A justificação para este fenómeno está no solo onde são plantadas e a cor varia conforme o nível de PH da terra. Passo a explicar: o PH mede a acidez numa escala de 0 a 14 – quanto mais próximo do zero, mais ácido está o meio; a meio da escala ou 7 considera-se que o meio está neutro e entre 7 e 14, está básico.

Assim e contrariamente ao que muitos de nós pensamos, a cor das hortênsias está directamente relacionada com a biodisponibilidade de alumínio que, por sua vez, é diretamente proporcional à acidez nos solos: quanto mais ácido é o solo, mais facilmente o sistema de absorção da hortênsia capta alumínio – quanto mais alumínio, mais azul/roxa fica a hortênsia. Captando menos alumínio, a hortênsia tende a ficar mais rosa, podendo chegar à cor branca.

Em resumo e em linguagem simples – se o PH da terra for ácido, a hortênsia varia nos tons de azul, se o PH for mais elevado ou básico, a hortênsia varia nos tons de rosa. Com base nesta informação, podemos mais facilmente ir modificando as cores desta planta magnífica.

Chegados aqui, deve estar a perguntar-se “o que é que as hortênsias têm que ver com Liderança?” Diria que, nada e ao mesmo tempo tudo!

Lembra-se certamente, do seu primeiro trabalho – do primeiro dia, em que ia cheio(a) de sonhos e expectativas; dos primeiros meses, em que se sentia completamente motivado(a) e estava sempre disponível, recorda-se?

Alguns de nós tivémos a sorte de, nesse percurso inicial, termos tido pessoas que também olharam para nós como tal e nos deram espaço para crescer e voar. Mas a grande maioria não é assim tão afortunada. E a verdade é que esses primeiros passos vão tatuar o estilo de liderança de qualquer um de nós no futuro, daí a sua vital importância.

Há poucos dias conversava com um líder que admiro e ambos concordámos que, por regra, o modelo de comportamento que testemunharmos no início de carreira vai ser determinante e servir de exemplo, cheguemos ou não a um qualquer patamar de liderança.

Tendo existido, ou não, esse paradigma de liderança, está nas mãos de cada um a escolha de nos tornarmos no Líder que gostaríamos de ter tido, por forma a podermos fazer florescer as hortênsias com a cor mais bonita, moldando o PH da terra – o próprio Líder.

Mas antes de plantarmos as hortênsias, há que preparar a terra e deixá-la com o PH desejado. Como ensina Brigette Hyacinth, faça então uma pequena instrospecção e pergunte-se o seguinte:

– Qual é o objectivo da sua liderança?

– Que estilo de liderança é o seu?

– Como era o exemplo de liderança que teve?

– O que é o sucesso para si e como é que o mede?

– Como gostaria de ser recordado(a) como Líder?

Uma vez respondidas estas perguntas, é altura de perceber se o seu ideal de liderança corresponde com a sua realidade presentemente – provavelmente não, em parte ou até no todo. E a verdade é que isso não é nenhum drama, antes pelo contrário! Já ter chegado a essa conclusão e ter tido a humildade de o admitir, é já meio caminho andado.

Há então que traçar objectivos SMART, que devem ser escritos à mão (aumenta o grau de comprometimento) e colocados em local visível com o respectivo nível de cumprimento (visual management) e começar a agir em conformidade.

Mas não se compare com os outros – como ensina Simon Sinek, tenha uma mentalidade infinita em que o objectivo não é competir com os outros – podemos olhar para a concorrência como uma referência, mas não para os ultrapassar ou competir com eles – mas connosco: ser, por exemplo, um melhor líder hoje do que tem sido nos últimos meses.

Simultaneamente, e se nunca deu a importância devida, pode também ir auscultando os seus colaboradores, de forma humilde e de coração aberto e tentar perceber o que realmente pensam da forma como os lidera. Mas seja brando – dialogue consigo mesmo de forma positiva e trate-se como gostaria que o seu melhor amigo o fizesse.

Ninguém nasce a liderar (embora haja quem tenha uma propensão natural para a liderança verdadeira Vs chefia) e eu acredito que qualquer um, querendo verdadeiramente, pode desenvolver as competências essenciais para uma liderança de sucesso. Mas mais do que desenvolver essas competências, é preciso compreender e interiorizar que a

A liderança é uma missão e não um título, ser Líder é estar ao serviço dos outros, com honestidade, transparência, coragem, humildade, consistência e com todos os sacrifícios daí inerentes.

Umas das qualidade dos grandes Líderes é a Escuta Activa – costumo dizer que saber ouvir é uma arte. Ainda outro dia ouvia uma conversa entre o grande Simon Sinek e um seu convidado – Bob Chapman, em que constatavam que nas escola dos Estados Unidos da América ensina-se e treina-se a arte de bem falar, com concursos de debate (“debating championships”), mas em lado nenhum se ensina a saber ouvir.

Bob Chapman é CEO da Barry-Wehmiller (empresa fornecedora de tecnologia e serviços de manufactura) e considerado pela Revista Inc. como CEO nº3 do mundo. O Chapman & Co. Leadership Institute foi criado sob o lema “medimos o sucesso pela forma como tocamos a vida das pessoas”. Nesse sentido, partilham as suas experiências e sucessos com outras empresas que deem igual importância às pessoas e têm vários cursos disponíveis – um deles com um módulo inteiramente dedicado à capacidade de escutar o outro, com total foco no interlucutor, sem julgamentos prévios – é mesmo imprescindível apurarmos esta arte!

A escuta activa está, para mim, interligada com outros factores: a gestão inteligente do tempoautonomia e feedback.

Um líder tem que ter a capacidade de saber gerir o seu tempo sabiamente, distinguindo o prioritário do acessório, o urgente do trivial mas tendo em mente que as pessoas devem estar sempre em primeiro. Se ainda não o faz e enquanto isso não se torna um hábito natural e espontâneo, marque na sua agenda um tempo diário para andar pelo escritório ou, se grande parte dos colaboradores ainda estão a trabalhar a partir de casa, ligue-lhes: fale com as pessoas, perceba como elas se sentem, ponha-se à disposição para ajudar a levantar qualquer obstáculo que exista – do mais simples ao complexo. Passe tempo com a sua equipa e faça-a sentir que está lá e para os servir. Acima de tudo, estabeleça e desenvolva os relacionamentos, independentemente do eventual distanciamento físico.

Na vida pessoal ou profissional, há quem precise / goste de ter uma maior ou menor orientação sobre como fazer as coisas – mas fomente essa autonomia, para seu bem, mas acima de tudo, para o bem dos seus colaboradores. Permita que errem, que aprendam com isso e que continuem o seu caminho. Simultâneamente, aproveite cada oportunidade para lhes dar a sua opinião construtiva – crie espaço para que cada um dos indivíduos floresça o seu talento e grandeza e desenvolva com eles um diálogo optimista.

Sempre que se proporcione, valorize e reconheça o trabalho, uma acção ou atitude – só um líder (de título ou não) tem essa capacidade de verbalizar e reconhecer com orgulho algo que um seu colaborador fez, tal como os pais fazem com os seus filhos. Afinal, não era o que gostaria que fizessem consigo?

Foque-se primordialmente nas competências e talentos de cada um em detrimento do que ainda há para melhorar – tenha diálogos positivos. Em vez de dizer “deves sorrir mais”, lembre que “quando sorris, os teus olhos brilham” e o efeito que isso tem no outro é completamente diferente.

Ao fazer tudo isto está, não só a criar relacionamentos mas também a dar o exemplo do que, para si, deve ser a liderança na prática e a servir de modelo para quem o vê diariamente (e que, muito possivelmente, um dia vai replicar).

Mas não se esqueça que um Líder não é uma máquina, mas uma pessoa como todas aquelas que serve. Como tal, sinta-se livre para se mostrar vulnerável, humano, errar e pedir ajuda – afinal, ninguém sabe tudo. E nunca se esqueça de agradecer. Lembro-me que quando era estagiária e o advogado mais velho me dava trabalho, eu terminava sempre com um natural “obrigada” e ele respondia-me “é a única pessoa que conheço que agradece quando lhe dão trabalho”. Agradecia por educação, mas também estava grata por confiarem em mim e todos os dias agradeço por tudo o que tenho e incuto isso aos meus filhos – experimente!

Assim e tal como as hortênsias, o estilo de liderança de cada um é o produto da maior ou menor “acidez” que absorvemos das primeiras experiências laborais e dos exemplos de liderança que cada um de nós testemunhou. Mas mais do que isso, essa absorção vai necessariamente influenciar a cor das plantas que vão florescer, ou por outras palavras, nas condições que cada líder consegue (ou não) proporcionar aos seus colaboradores para serem felizes.

Entendo que os snacks grátis, mesas de ping pong, playstations ou matraquilhos são um extra e elementos “nice to have” mas que, por si só não evitam que as flores murchem e sequem. Um ambiente de trabalho saudável e seguro, relacionamentos fortes, uma liderança que serve, apoia, inspira, reconhece e valoriza, tudo de forma consistente e sustentável – esses sim, são os “must have”.

Seja sábio a escolher o PH da sua terra, para que as suas hortênsias floresçam com a cor mais bonita!

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